Em 1580 o duque de Alba (Fernando Álvarez de Toledo y Pimentel) atravessa a fronteira no Caia e chega doze dias depois a Setúbal. Decidido a dominar Lisboa, o duque esperou a chegada da armada vinda de Cádis que fundeou em Cascais, localidade que se rendeu, seguida das fortalezas de São Julião, de Belém e da Caparica. Apenas lhe fizeram frente as tropas que o prior de Crato reunira e o esperavam na margem esquerda da ribeira de Alcântara, no dia 25 de Agosto de 1580. Enquanto D. António acorria ao combate, a ala esquerda das tropas castelhanas rapidamente desfez as instáveis fortificações portuguesas. Ferido o Prior do Crato, e obrigado a abandonar a luta, a batalha acabou meia-hora depois de ter começado. (fonte: WIKIPÉDIA)
Por incúria dos nossos governantes, sobretudo, mas também dos representantes do sector, tem-se vindo a assistir na pesca – da sardinha em particular – a uma nova Batalha de Alcântara. Em 1580 essa batalha redundou não só na perda da autonomia territorial, mas numa das mais copiosas derrotas infligidas pela armada espanhola a Portugal.
Como já aqui fiz referência em textos anteriores, a forma como o governo espanhol tem olhado para os pareceres científicos do ICES/CIEM e para a pretensa crise da sardinha tem sido substancialmente diferente do português. Se os nossos vizinhos definiram uma possibilidade de pesca mensal de mil toneladas (Boletín Oficial del Estado de 9 de Janeiro de 2015), o governo português optou por colocar pescadores contra pescadores, dividindo a quota nacional em quintais com base no histórico das embarcações. Enquanto uns (nuestros hermanos), vão capturando sardinha ao sabor do tempo, outros (os portugueses) vão-se inibindo de capturar sardinha, assumindo limites ridículos, de forma a estenderem a sua diminuta possibilidade de pesca no tempo.
Para ajudar na composição deste ramalhete, no ultimo despacho (nº 5119-H/2015) publicado pelo Gabinete do Secretário de Estado do Mar, está referido na alínea 8.c) que a pesca da sardinha será encerrada «Quando as descargas conjuntas das frotas portuguesas e espanhola atingirem o limite de 19.095 toneladas correspondente às capturas resultantes da aplicação da regra de exploração prevista no Plano de Gestão para a Sardinha Ibérica em 2015.» Ou seja, mesmo que os portugueses mantenham as suas restrições e não capturem as suas 13.000 toneladas, se os espanhóis ultrapassarem as suas 6.000 toneladas, a pesca da sardinha será encerrada na mesma. Para Espanha não existem limites nacionais, existe um único limite ibérico, tal como se pode ler no Boletín Oficial del Estado, de 9 de Janeiro de 2015, que define a possibilidade de pesca mensal da frota espanhola.
Tudo isto obviamente, acaba por deitar por terra um pressuposto, não aceite pelos espanhóis, de que a quota ibérica deveria ser distribuída na proporção de cerca 67% para Portugal e de 33% para a Espanha, com base nas capturas históricas dos 2 países. O repúdio de “nuestros hermanos” a esta chave de repartição ganha outra dimensão se olharmos para a evolução desta proporção da captura de sardinha desde que foram instituídas restrições à pesca.
Abaixo o quadro com essa evolução com base nos dados apresentados pelo ICES/CIEM no seu último relatório de 16 de Julho, que aconselha que em 2016 se capture menos de um décimo do que se capturou este ano.
Ano |
Captura Ibérica (em Toneladas) |
Captura PT (em Toneladas) |
Captura ES (em Toneladas) |
% Quota PT |
% Quota ES |
2008 |
101.000 |
75.078 |
25.922 |
74% |
26% |
2009 |
88.000 |
67.235 |
20.765 |
76% |
24% |
2010 |
90.000 |
67.954 |
22.046 |
75% |
25% |
2011 |
80.000 |
57.971 |
22.029 |
72% |
28% |
2012 |
55.000 |
31.849 |
23.151 |
58% |
42% |
2013 |
46.000 |
28.876 |
17.124 |
62% |
38% |
2014 |
27.937 |
16.272 |
11.665 |
58% |
42% |
Da simples observação do quadro se percebe que a limitação de pesca não tem sido igualmente dolorosa nos 2 países. Bem vistas as coisas, a crise da sardinha pode até ser vista como uma oportunidade de ouro para que a “Armada Espanhola” virasse a seu favor uma batalha que sempre lhe foi desfavorável, a da captura da sardinha.
Politicamente a gestão deste problema é um absoluto desastre que ficará na história do sector. Esta nova Batalha de Alcântara, tal como a outra, teve uma vitória esmagadora dos espanhóis.