Em Novembro do ano passado, o surto de Legionella, que causou infelizmente mais de uma dezena de mortos e sequelas graves nos sobreviventes, veio uma mais demonstrar a fragilidade do actual regime jurídico de responsabilidade ambiental que, passados mais de seis anos desde a publicação do diploma legal, ainda não se encontra devidamente regulamentado e dotado de eficácia.
A Quercus tem repetidamente alertado, tanto o actual como anteriores Governos, para os riscos ambientais e de Saúde Pública que a ausência de um regime de responsabilidade ambiental acarreta para o país. Não sendo, por si só, suficiente para evitar todas as infracções em matéria ambiental, é indubitável que uma maior e – sobretudo – uma mais eficaz responsabilização civil subjectiva e objectiva dos operadores-poluidores contribuiria decisivamente para prevenir a ocorrência de ilícitos ambientais e de surtos epidémicos que tenham na sua origem uma actividade poluidora. Como contribuiria, igualmente, pelo efeito dissuasor das coimas, e/ou outras sanções ou penas a aplicar, para diminuir os riscos e a quantidade de actividades empresariais desenvolvidas de forma ilegal e irresponsável, e que põem em risco o Ambiente e a Saúde Pública.
O Preâmbulo do Decreto-Lei nº 147/2008, de 29 de Julho, diploma que aprovou o regime jurídico de Responsabilidade Ambiental, refere que “se num primeiro momento a construção do Estado de direito ambiental se alicerçou sobretudo no princípio da prevenção, actualmente, a par deste princípio, surge como fundamental o princípio da responsabilização”. Para a Quercus, os sucessivos Governos e as demais entidades públicas competentes há muito que deveriam ter actuado com decisão no sentido da aplicação prática da Lei em matéria da responsabilidade civil ambiental, regulamentando o seu cumprimento pelos vários agentes. Não apenas porque a aplicação do regime da Responsabilidade Ambiental é economicamente mais vantajosa, mas também porque é simultaneamente mais eficaz do ponto de vista da prevenção ambiental e saúde pública.
Na verdade, seis anos depois da entrada em vigor da Lei sobre Responsabilidade Ambiental, o Governo ainda não fixou, por portaria, limites mínimos para os montantes das garantias financeiras que os operadores têm de realizar, para fazer face a eventuais acidentes, nem definiu as linhas de orientação quanto à constituição das mesmas garantias. Não é por isso de estranhar que, actualmente, a maioria das empresas potencialmente poluidoras ainda não estão conformes com a legislação e não constituíram qualquer garantia, tendo outras contratado seguros ou outro tipo de garantias financeiras com valores muito aquém do razoável para os potenciais riscos que a sua actividade encerra.
O número de empresas portuguesas capazes de aferir os seus próprios riscos ambientais é muito reduzido, pelo que urge regulamentar esta matéria, em particular adequando os limites mínimos das respectivas garantias financeiras de molde a garantir que o poluidor – ou a Seguradora para a qual tenha transferido a responsabilidade – tem a necessária e exigida capacidade financeira para suportar os custos de reparação dos danos ambientais, e a internalização do custo social gerado, e tornando assim obrigatória a comprovação da constituição da referida garantia financeira perante a autoridade fiscalizadora competente (APA- Agência Portuguesa do Ambiente).
É hoje evidente a falta de capacidade das entidades fiscalizadoras para fazerem cumprir a lei, o que resulta na existência de cada vez mais operadores a actuar ilegalmente. Daí que, em matéria de fiscalização, extremamente importante pela sua componente preventiva, a Quercus defenda a necessidade de o país ter uma verdadeira fiscalização ambiental que, sendo eficaz, evitaria certamente a ocorrência de novos danos ambientais.
Mas o que normalmente se verifica é precisamente o contrário, ou seja, a fiscalização só acontece de forma “extraordinária”, quando o dano já ocorreu e não antes, com todos os prejuízos que daí decorrem, como é o caso dos que se verificaram com o surto epidemiológico verificado em Vila Franca de Xira. É pois esta realidade que urge alterar e inverter, no quadro de uma verdadeira e efectiva responsabilização ambiental das empresas.Fotografia de capa por Pulmonary Pathology

Carla Graça
